Nunca
fiquei em Lisboa no Natal. Aquela noite de 24 para 25 de Dezembro é
sempre passada lá na minha Várzea onde faz mesmo muito frio, mas
onde o meu coração está sempre quentinho.
Por
isso, não sei de nada. Não faço a mínima ideia de como são esses
dois dias na capital mas, a julgar pelas últimas semanas, espero que
tudo abrande.
É que
a capital tresloucou. O espírito de Natal assustou-se e fugiu a
correr.
Por
todo o lado há lisboetas apressados com olhares desvairados,
carregados de sacos e embrulhos a correrem para a loja mais próxima.
De caminho atropelam-se uns aos outros, enquanto pensam que, para ao
ano, não dão prendas a ninguém. Só aos miúdos. Ou então começam
em Novembro. É isso. Começam em Novembro.
Filas
de carros intermináveis, lentas e barulhentas. Dentro das viaturas
caras de poucos amigos e mãos na buzina. Está mais que provado que
as buzinadelas fazem os obstáculos desaparecer por magia e assustam
os semáforos, que, passam imediatamente a verde. Ou talvez não.
Juro por todos os santinhos que ontem de manhã em Campo de Ourique
os semáforos, em sinal de protesto por tanto mau humor, mudaram para
vermelho e assim ficaram. Depois de quinze minutos à espera, os
automóveis lá foram avançando pela Rua Ferreira Borges. Mas os
semáforos, mostrando firmeza de carácter, vermelhos continuaram.
Os
lugares de estacionamento são uma miragem. Durante o dia, as
compras. Durante a noite, os jantares de Natal. Na sexta-feira
passada, quando cheguei aqui ao bairro, andei uma hora às voltas à
procura de um buraquinho para enfiar o meu carro. Quando finalmente
encontrei, um chico-esperto ignorou-me, chegou e estacionou. Com a
alma cheia do espírito da época,aproximei-me e pedi-lhe
satisfações. E ele deu-me. Eu só estava a fazer pisca parada na
rua e aquele lugar era público. Um ser de elevado estatuto moral a
espalhar energia natalícia.
No
meio de isto tudo, penso sempre: ainda bem que me vou embora. Quando
eu voltar, já toda a gente recebeu os seus presentes, esteve com a
sua família e andarão com um sorriso nos lábios. Depois do Natal
poderemos todos ser felizes outra vez.
Até
lá, vou tentar sorrir a todas as pessoas que vierem contra mim,
piscar o olho aos semáforos teimosos e tolerar ladrões de
estacionamento. É a minha prenda de Natal para os alfacinhas.
Boas
festas.
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