domingo, 25 de janeiro de 2015

O Padroeiro.

Por toda a Lisboa cheira a sardinha e carvão. Na Avenida da Liberdade desmontam-se as tribunas de honra e limpam-se do chão os copos de plástico e as lantejoulas que cairam dos vestidos das marchas. Os lisboetas estão em casa com as persianas fechadas a curar a ressaca. As festas do padroeiro da cidade são de arromba e até os festeiros profissionais sucumbem nesta altura do ano.

Assim seria Janeiro. Sairíamos à rua para comemorar o padroeiro de Lisboa, se, ao caminho não se tivesse metido um tal de António, mais dado a festas, que os alfacinhas colocaram no pedestal dos pedestais. E foi uma devoção tão arrebatadora, que este santo careca e dado a cheirar manjericos, roubou o dia feriado ao São Vicente, o oficial. O verdadeiro padroeiro de Lisboa.

Vicente, um castelhano de Saragoça, cristão martirizado até à morte por se recusar a oferecer sacrifícios aos deuses romanos, foi atirado aos animais para ser devorado. Porém, um corvo ficou de sentinela ao corpo e não permitiu que tal acontecesse. A maravilha foi vista como um milagre e logo ali o enterraram e ergueram uma igreja.

Depois vieram os mouros que não acharam piada nenhuma ao culto daquele lugar. Colocaram os restos mortais de São Vicente num barco que largaram à deriva no mar.

Levado pelas marés, o barco foi naufragar ali ao Algarve, num sitio chamado Promontório Sacro, que hoje é conhecido por Cabo de São Vicente.

De novo se enterrou o corpo e se ergueu igreja. Uma povoação surgiu em volta e a vida voltou à normalidade. Um santo, uma aldeia.

Até que os mouros vieram outra vez. E outra vez o culto foi impedido.

Mas chegou o dia em que D. Afonso Henriques resolveu esticar o Condado Portucalense até ao Algarve e ter o seu próprio reino. Ao chegar à tal igreja lá para Sul, mandou resgatar as relíquias do, já habituado a transladações, Vicente e trazê-lo para Lisboa. Toca a enfiar o corpo outra vez num barco e ala para cima.

Ao longo da viagem, dois corvos ladearam a embarcação e velaram o mártir. À chegada a Lisboa, o que sobrou do santo, foi sepultado numa igreja fora da muralha do castelo. Os habitantes da cidade, comovidos com a história, passaram a venerar o São Vicente, que em 1173 foi proclamado santo padroeiro de Lisboa.

Os corvos foram directos para as armas da cidade, a igreja passou a chamar-se de São Vicente de Fora e chegou a dar nome a uma freguesia de Lisboa. O dia 22 de Janeiro, passou a ser o dia de São Vicente.

Quem não deve ter gostado muito disto, foi o São Crispim. Ele é que era o padroeiro da cidade até chegarem as ossadas desse castelhado armado em mártir. Mas Deus não dorme. E um dia chegou o outro.

O tal do António.

domingo, 4 de janeiro de 2015

Feliz ano novo.







O ano de 2015 começa amanhã. Com esta coisa do feriado à quinta-feira e do fim-de-semana, parece-me que só amanhã é que Lisboa vai pôr o pé fora da cama e dizer: Olá 2015. E será a muito custo, porque, com o frio que tem estado, ficaria contente por hibernar até Março. Debaixo de grossas camadas de cobertores até chegar a Primavera.

Portanto, hoje é o dia para fazer os pedidos para o novo ano que se avizinha. Lisboa é cidade de fé e superstição. Logo, quando soarem as badaladas do final do ano, empunhará as passas e do cimo do Arco da Rua Augusta formulará auspiciosa os seus sonhos para 2015.


Primeiro

Que as ruas deixem de ter buracos. Que a calçada portuguesa seja bem tratada.

Segundo

Que todos os sem-abrigo passem a ter um tecto.

Terceiro

Que deixem de haver filas de trânsito. Melhor, que deixem de haver filas.

Quarto

Que os lisboetas deixem de deitar lixo e de cuspir para o chão. Já agora, que apanhem os cocós dos seus cães.

Quinto

Que os terramotos e tsunamis fiquem lá longe.

Sexto

Que deixem de haver barreiras arquitectónicas para os deficientes e que se respeitem os seus lugares de estacionamento.

Sétimo

Que deixem de haver greves nos transportes públicos (porque tudo se resolve a contento de todos).

Oitavo

Que toda a gente tenha casa.
Que toda a gente tenha casa a um preço razoável e que acabe a especulação imobiliária.

Nono

Que haja Verão.

Décimo

Que venham mais turistas.

Décimo primeiro

Que a crise acabe (se é para pedir, pedem-se milagres).

Décimo segundo.

Que os alfacinhas sejam felizes.


Depois, erguerá a sua taça de champanhe, brindará com o Tejo e dirá:

Feliz ano novo.