Era uma vez um taberneiro que
morava no Bairro Alto e por ali tinha a sua tasca. A tasca era afamada por
servir verdadeiros pitéus. Por ali passavam os lisboetas famintos e até altas
horas saciavam a sua gula.
Uma bela noite, com muita
frequência de clientela, de tanto entra e sai e de tanta quantidade servir,
chegou o momento em que pouca coisa restou na despensa. A saber: uma posta de
bacalhau, ovos, um raminho de salsa e, como em todos os sítios de Portugal,
alhos, cebolas e batatas.
Tendo chegado um novo grupo de
comensais, logo ali se perguntou se ainda havia ceia. O taberneiro, que nunca
dava parte de fraco, respondeu que sim. Que havia um prato extraordinário.
Foi para a cozinha, conversar com
o avental. Que estavam numa enrascada de difícil solução. Olhou para os ingredientes
que sobravam e sentiu a doce veia da inspiração a latejar. E se desfiasse o
bacalhau? E logo se deixou guiar pela musa culinária. Bacalhau desfiado a
alourar na caçarola com azeite, alho e cebola. Batatas a fritar. Juntou tudo e
misturou-lhe os ovos batidos. Salsa por cima, para apaladar.
Nervoso, na expectativa de saber
se gostariam ou não, lá levou a travessa para a mesa. E ali ficou à espera da
primeira garfada. Das bocas deleitadas saíram os melhores elogios. Que prato magnífico
era aquele, que nunca haviam comido?
O taberneiro, cujo nome de
certeza adivinham, respondeu com vaidade: Bacalhau à Braz, meus senhores.
Bacalhau à Braz.
Com alguma fantasia à mistura, a
história é mais ou menos esta. O Bacalhau à Braz, ou à Brás, é hoje um tesouro
da nacional culinária. Cozinha portuguesa de onde nunca tenha saído este prato,
não é digna de se chamar cozinha. É a prova de que a alma nacional também se
traduz naquilo que comemos. É que não conheço nenhum português que não goste de
Bacalhau à Braz.
Dizem os puristas que se transformou
em fast food. Que tem sido vilipendiado na sua essência, com o uso das batatas palha
compradas no supermercado. Pelo atum, frango, alho francês e uma série de
outras coisas à Braz que por aí se inventaram.
Mas nesta coisa da profanação, o
Jamie Oliver, cometeu a heresia de, ao apresentar este prato do nosso panteão
na televisão, ter juntado as batatas fritas depois dos ovos. Logo foi
bombardeado por portugueses indignados. Já não bastava a esses ingleses terem
ficado com o chá das cinco, iam agora mudar-nos o Braz.
Do Bairro Alto para o mundo, o
Bacalhau à Braz confirma que a necessidade aguça o engenho. E que belo engenho
este, alfacinha de nascença, mas um cidadão do mundo. E é sempre bom, mesmo
quando um pouco adulterado. O meu favorito é o da minha mãe, que o faz com os
preceitos do Braz. Só de pensar, cresce-me água na boca. Aliás, foi este o
motivo de ter escolhido este tema para hoje. Aproveito e deixo aqui o recado:
Mãe, no próximo sábado, vou aí jantar.
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