domingo, 1 de novembro de 2015

Ao longe.



Há dias que aquela frase do Fernão Capelo Gaivota que diz que “não há longe nem distância” me anda a soar na cabeça.
É uma frase bonita. Aberta a oportunidades e a significados esperançosos e carregados de emoções. Um chocolate quente para quem tem a alma em temperaturas negativas.

Contudo, quando estamos quase todo o ano longe das pessoas com quem passamos o Natal, esta frase fecha-se em palavras bonitas que não nos dizem nada. É que a vida anda e, mesmo que a distância seja encurtada pela tecnologia, o tempo não pára. Passam os anos e nós não estamos lá.

Sou uma alfacinha da candonga e até passo bem por um produto de marca registada. Esta Lisboa faz parte dos meus tecidos e dos meus pespontos. Mas, quando chega a hora da saudade, o único fado que canto é o Fado Beirão.

O lisboeta genuíno não sabe a sorte que tem. Quando chegam os domingos preguiçosos e vai almoçar aos pais. Quando leva a sopinha para a semana na marmita que a mãe preparou. Quando precisa de coser a bainha das calças, tirar uma nódoa da camisola ou só de um olhar amoroso e sem condições e passa em casa dos pais. Ou dos avós. Ou da irmã.

É que isto de manter uma relação à distância com a família requer uma boa logística. Um telemóvel com boa definição de som para que os Parabéns soem tão desafinados como se estivéssemos lá. Uma boa câmara para filmar para mostrar as mudanças de móveis que fiz cá em casa. Uma gestão razoável da ansiedade para esperar pelo telefonema depois da consulta do médico em que se foram mostrar uns exames com valores que assustam. Marcar férias para o dia em que está previsto nascer a sobrinha. Vê-la crescer pelo Skype e conter a lágrima quando ela nos manda o primeiro beijinho pelo telefone.

Depois há os dias negros. Os dias em que a distância se transforma em muitos longes. Quando toca o telefone para dizer que alguém lá morreu. E nós, que íamos lá no próximo fim-de-semana, não queremos aceitar que a morte chegou primeiro. Não queremos não estar lá. E por muitos braços lisboetas que nos abracem cá, não há consolo que nos aqueça. Fazemo-nos ao caminho para casa, agradecemos todos os momentos em que estivemos lá e lamentamos todas as nossas distâncias. Cada fatia de bolo de aniversário que não comemos, cada ida ao médico em que não estivemos e cada domingo de sol que não passeámos.

Por isso, não me vou deixar ir na cantiga do “não há longe nem distância”. Por agora não acredito. Fico cá a contar quilómetros e a medir espaços de tempo que não consegui preencher.

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