Cristo
Rei nunca vais baixar os braços? Há anos a tentar abraçar esta
Lisboa que te pisca o olho sempre que o Tejo se distrai. Há anos à
espera que o Tejo seque e Lisboa venha a correr para se entrelaçar
em ti.
Tudo
começou em 1934. O Cardeal Cerejeira foi ao Rio de Janeiro e mirou o
Cristo Redentor no cimo do Corcovado. Logo pensou para os seus
paramentos que tinha que ter um igual em Portugal. Só precisava de
um motivo.
O
motivo chegou com a Segunda Guerra Mundial. Se Portugal não fosse à
guerra, erigir-se-ia um Cristo tão alto e grandioso que poderia ser
visto por Deus lá de cima do céu.
Salazar,
não quis violar a amizade com Inglaterra e estava mais interessado
na vocação ultramarina do Império. Não iriamos guerrear. E o
milagre lá se deu.
Em
1949 lançou-se a primeira pedra no Pragal, 113 metros acima do nível
do Tejo. Dez anos mais tarde, foi inaugurado no dia de Pentecostes.
Vieram representantes católicos de todas as terras portuguesas de
aquém e d'além mar e até veio a imagem da Nossa Senhora de Fátima
para a grande consagração da estátua e de Portugal ao Sagrado
Coração de Jesus.
Setenta
e cinco metros de pórtico projectado pelo arquitecto António Lino,
sobre os quais se ergue um Cristo de 28 metros, obra do escultor
Francisco Franco de Sousa. De costas para o mar. De braços abertos
para a capital.
Mal
abriu os olhos viu Lisboa. Mal abriu os olhos, cobiçou-a e pecou. E
Deus lá do alto condenou-o à pedra eterna. De braços estendidos
ao desamparo para todo o sempre. De olhos postos no romance entre a
linda Lisboa e o seu rival Tejo para a eternidade.
Mesmo
estando do lado de lá do rio, os lisboetas reclamam ter tanto
direito a chamar o Cristo Rei de seu, como os habitantes da margem
sul. Muito criticado por se tratar de uma obra do Estado Novo e do
mal afamado Cardeal Cerejeira, por ser um mono a quebrar a linha do
horizonte, a verdade é que a vista do outro lado não seria a mesma
sem ele. Como poderiamos viver sem aquele ser solitário que nos
conforta com a sua constante presença incansavelmente disposto a
consolar-nos das nossas tristezas? Erguer o olhar para o Cristo Rei é
erguer o olhar para um velho amigo que nos entende.
Mas
quem consola o Cristo Rei? Quem vai ao seu encontro e lhe baixa os
braços e lhe diz para descansar?
Talvez
um dia Deus se canse de o castigar e desça lá de cima, lhe dê o
mais esperado xi-coração da história da humanidade e lhe perdoe.
Nesse dia, espero que ele não se vá embora. Espero que ele estenda
os braços a Lisboa, lhe pisque o olho e lhe pergunte: “ Queres
espreitar a vista daqui de cima?”
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