Sr. Carlos, Sr. Domingos e todos
os outros senhores que todos os dias me querem comprar o carro,
Espero que esta que vos remeto
vos vá encontrar bem.
Escrevo-vos para vos agradecer o
interesse demonstrado na aquisição da minha viatura. O esmero com que colocam diariamente
o vosso panfleto no meu limpa-pára-brisas comove-me. Admiro a resiliência do ser humano e gosto
sempre de a encorajar, por isso me é tão difícil redigir esta carta. É que
pressinto que aquilo que vos vou dizer poderá partir-vos o coração e desmotivar
a vossa caminhada rumo à aquisição de todos os automóveis de Lisboa. No
entanto, o que tem que ser dito tem que ser dito. Cá vai:
EU NÃO VENDO.
Mas não pensem que esta missiva é
de despeito. É sempre um prazer diário ir tirar o panfleto do vidro do carro.
Principalmente naqueles dias em que chove muito e, já ilegível e empapado, me
fica agarrado às pontas dos dedos. Ou quando me esqueço e passado um dia ele
está colado e difícil de retirar.
A verdade é que, às vezes até dão
jeito. Quando, por falta de caixote do lixo onde os depositar, os acumulo no
porta-luvas. Tê-los ali à mão de semear se precisar de apontar alguma coisa é
muito bom. No entanto, o que tem que ser dito tem que ser dito. Cá vai:
NÃO PONHAM MAIS PORQUE EU NÃO
VENDO.
E sensibiliza-me que vocês
estejam dispostos a ligar-me se eu vos der um toque. Que vão ao local buscar
com reboque e assinem um termo de responsabilidade no acto de compra. Que
paguem na hora e tratem de toda a documentação. E fico com uma lágrima a querer
verter-se sempre que leio a frase motivacional que o Sr. Domingos lavra entre parênteses:
Feliz é o homem que confia em Deus. E eu fico logo mais confiante e penso que
no dia seguinte não vou ter lá o vosso papelinho. Mas não tenho fé suficiente.
No dia seguinte lá está ele à minha espera. Houve um dia até que tinha dois. Um
de cada lado do pára-brisas. Enternecedor. No entanto, o que tem que ser dito
tem que ser dito. Cá vai:
NÃO PONHAM MAIS PORQUE EU NÃO
VENDO.
Desistam. A compra do meu carro
foi ponderada. Pensei muito, fiz contas, pesquisei e analisei durante cerca de
meia-hora. E correu muito bem. Estou mesmo satisfeita. Não avaria, a Câmara
Municipal de Lisboa ainda não o tentou recolher e tenho pago a prestação todos
os meses. Por isso, é com pesar que vos informo que não contem comigo para a vossa demanda para
comprar todos os popós da capital. Peguem nos vossos folhetos e enfiem-nos
noutro vidro porque EU NÃO VENDO.
Cumprimentos,
Couve-Flor.
Em tempo de calor intenso dá jeito um papelinho para evitar colar a borracha ao vidro.
ResponderEliminarPronto. Se calhar tenho que repensar este texto ;)
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