Fotografia de André João Freitas. |
Quando pensamos em ponte
sobre o Tejo pensamos na Ponte 25 de Abril.
A ponte é um dos
desenhos mais bonitos do horizonte de Lisboa. Soberba e altiva.
O Tejo é casado há mil
anos com Lisboa na comunhão geral de bens. Ama a cidade de forma
louca e transtornada. Mas tem a ponte por amante.
Era inevitável. Naquele
Agosto de 66 em que a baptizaram com o inglório nome de Ponte
Salazar, só quem fosse cego é que não via que aquilo ia dar em
paixoneta. Vestida de vermelho, elegante e curvilínea, sempre em
pose sensual. O Tejo não é de ferro. Mas a ponte é. E por mais que
Lisboa a tente empurrar, ela ancorou para ficar. E assim nasceu o
triângulo amoroso mais monumental de que há memória.
E se o Tejo nunca há-de
pedir o divórcio a Lisboa, também é verdade que Lisboa nunca se
há-de sentir completamente segura. A ponte é mesmo bela e não sai
de cima do seu amante.
O normal, nestes casos, é
que as pessoas tomem o partido da esposa traída. Porém, nesta
história, as opiniões dividem-se em duas. Toda a gente adora ambas.
E há até quem diga, que não poderiam viver uma sem a outra.
A ponte é adorada pelos
lisboetas. De manhã envolta em neblina faz os corações sangrar de
nostalgia. Ao longo do dia, os reflexos de luz animam o olho e a
alma. O pôr-do-sol é um clássico do engate alfacinha. E à noite,
vestida de luzes, faz-nos sorrir ou filosofar. Ou as duas coisas ao
mesmo tempo.
Não há recorte
arquitectónico mais perfeito nas redondezas.
No Verão é indício de
praia. Aos fins-de-semana é ver o alfacinha em romaria às praias da
Costa para passar o dia a torrar ao sol. E, se é a ponte que os
leva, é dela que eles reclamam. Que é sempre a mesma coisa. Bicha
para entrar. Bicha para sair. Para o próximo domingo não estou para
isto. Temos é que vir mais cedo. O que, inevitavelmente resultará
numa repetição na semana a seguir.
Sobre ela escrevem-se
canções. Fala-se do seu tabuleiro todas as manhãs na rádio.
Escrevem-se poemas. Fala-se do aumento das portagens. Fotografam-se
postais. Desenham-se quadros. Escrevem-se suicídios. Fala-se de
acidentes na faixa da direita.
Nela não se fazem
almoços patrocinados por detergentes. É uma ponte requintada. Há
maratonas. Nada de manifestações, ditam os senhores que mandam,
esquecidos de que agora se chama 25 de Abril. Quando muito uns
buzinões.
E é com carinho que nos
recebe quando regressamos a Lisboa. Vir de longe e vê-la do avião
ou chegar por ela vindos do Sul, dá-nos a resposta esclarecida para
aquela pergunta manhosa que às vezes nos fazemos: porque é que não
me vou embora para o campo?