domingo, 9 de fevereiro de 2014

Street art.

Lisboa é uma cidade finamente rendilhada. Em qualquer rua se podem encontrar verdadeiras maravilhas de fino lavor criadas com cuidado pelas chuvas dos últimos tempos. Vulgarmente conhecidas por buraco. Ora fundos, ora largos, ora aos pares, ora isolados, é vê-los a multiplicarem-se em hipóteses criativas pelo chão da capital.
O buraco no alcatrão alfacinha já tem um lugar de destaque no património arquitectónico da capital. É poesia esculpida que os automóveis lêem em braille. Circula com precaução. Olha por onde vais. Da próxima vez, vais daqui para a oficina.

E não me venham dizer que é falta de manutenção por parte da Câmara Municipal. Que são obras feitas à pressa. Que é esta mania tão portuguesa de remendar sem consertar. A verdade é que tudo isto faz parte de um plano camarário para que Lisboa tenha uma série de condutores de elite, aptos a conduzir em qualquer tipo de terreno. Assim poupar-se-à imenso em alcatrão.

Conduzir nestas ruas é um verdadeiro treino.

Treinamos a memória. Tinha a certeza que aquele buraco não estava ali ontem. E este também não.

Treinamos a perícia. Volante para a esquerda. Já para a direita. Curva suave. Em ziguezaque. Em primeira a tentar sair daqui.

Treinamos os conhecimentos morfológicos. Ali está uma cratera. Ali uma lagoa. Acolá um charco. Aqui só pode ser o mar.

Treinamos a geometria. Circulo. Círculo. Quadrado. Rectângulo. Quadrado. Círculo. Mala do carro. Triângulo.

Tudo isto em prol de qualidade de vida e da preservação de uma certa estética do pavimento rodoviário.
Quase poderíamos afirmar que esta é que é a verdadeira street art. A arte da rua. Do chão da rua. Tenho até ouvido uns rumores que falam da contratação de Vhils, esse fabuloso escultor de paredes, para detonar uns buraquinhos em forma de rostos na via central da Avenida da Liberdade.

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