Chegaram
os espanhóis. Olé.
D.
João IV está a dar voltas no túmulo desde sexta-feira e o obelisco
dos Restauradores encolheu um bocadinho.
Vieram
buscar a taça e conseguiram. De avião, de comboio, de autocarro e
de carro encheram a cidade. Diz-se que são para cima de duzentos
mil.
Ocuparam
o aeroporto com artilharia pesada. Aviões nunca antes vistos em
Lisboa aterraram na Portela, em Figo Maduro, em Cascais e falou-se em
encerrar a A5 caso o espaço não chegasse.
Não
restou um quartinho dos fundos nas águas furtadas da rua mais
esquecida para dormir mais um espanhol. Sobre lotados, os prédios
lisboetas incharam com tanto euro que os nuestros hermanos pagaram
para alquilar la noche. Olé.
O Metro passou a avisar Por su seguridad no
superan la franja amarilla. As lojas da Baixa guardaram os
cachecóis da Selecção Nacional e exibiram nas montras os símbolos
das equipas madrilenas. Todos os cafés têm o cartaz da Champions à
porta em sinal de boas vindas e de que querem fiesta.
E
fiesta houve. Cânticos de estádio na Rua Augusta. Espanhóis aos
pulos. A Praça do Comércio transformada em campo da bola. Espanhóis
aos gritos. Filas no Rossio para comprar as camisolas oficiais.
Indianos a venderem as não oficiais. Cerveja. Espanhóis. Espanhóis.
A
cidade entrou na onda e saiu à rua para festejar com eles. Coisa
nunca vista. Os lisboetas felizes com a invasão. Com a desculpa de
que estavam a apoiar o Cristiano Ronaldo na manga, foi ver os locais
a dançar e em amena convivência com os adeptos. Olé.
E foi
ver na televisão os jornalistas a afirmarem com a mais firme certeza
que isto nunca poderia acontecer com equipas portuguesas. Que os
adeptos nacionais nunca poderiam confraternizar uns com os outros num
país estranho sem se travarem de razões. Que estes espanhóis eram
um exemplo a que devíamos atentar. Olé.
No
sábado às oito da noite estavam todos arrumadinhos no Estádio da
Luz. Ou, aqueles muitos que
vieram
sem bilhete, arrumadinhos no Rossio ou no Parque Eduardo VII. Durante
120 minutos Lisboa parou.
Ganhou
o Real Madrid. Mas ouvi dizer que os Atléticos não deixaram de
festejar.
Hoje
de manhã abri o Facebook e o que me salta ao olhar logo são
críticas. A esses castelhanos que deixaram o Rossio todo sujo. Uns
cerdos. Que vão sujar para a sua terra. Nunca os adeptos portugueses
deixariam as Puertas del Sol assim. Nunquinha.
Há-de
ser sempre assim. Quando passamos muito tempo com espanhóis,
deixamos a Padeira de Aljubarrota que há dentro de cada um vir ao de
cima e desatamos à paulada. Olé.
Durante
um fim-de-semana o sonho luso realizou-se. Lisboa foi capital desta
Ibéria danada. Uma península que nos limita e nos aproxima. Depois
de séculos a afirmar que do lado de lá da fronteira não vem bom
vento, a coisa ia dando em casamento.
Mas
descansem os patriotas mais arreigados. Lisboa é nossa. Os espanhóis
já estão de saída. Levam a taça, deixam os euros, salero e talvez
saudade. Olé.
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