Os pontos de encontro são sempre
pontos de partida. O sítio onde coincidimos com alguém num tempo certo para
depois seguirmos juntos, ou separados, um destino porventura definido. Todas as
cidades têm um ponto de encontro. Todas as cidades têm um ponto de partida que
começa num ponto de encontro. Lisboa não escapa à regra.
O Camões é o ponto dos encontros
de Lisboa. Ali, onde o Bairro Alto arranca para subir a colina, onde o Chiado começa
a sua descida até à Baixa, onde a Rua do Loreto avança sobre o Combro e a Rua
do Alecrim flutua até ao rio, cruzam-se os destinos que dali continuam para
novas aventuras. O Camões é o ponto de partida de Lisboa. Quem nunca marcou
encontro ali para depois ir jantar ao Bairro, desfilar na Rua Garrett ou ir
beber um copo à Bica que atire a primeira pedra.
O Camões é o único nome da
toponímia lisboeta a que, sendo uma praça, todos chamam largo. Quase ninguém
vai à Praça de Luiz Vaz de Camões. Agora, o Largo do Camões já todos atravessam.
Ou por lá se encontram. É que assentar praça é diferente de passar ao largo. E
ir chatear o Camões todos vamos de vez em quando, mas não por muito tempo. Que
por norma no Camões não se está. Espera-se. Espera-se pelo amigo, pelo 28, pela
sineta do pastel de nata da Manteigaria. Fazem-se horas para estar noutro sítio
ali por perto, sentados na esplanada do Quiosque do Refresco com uma amêndoa amarga
pingada de limão.
Boas esperas que alcançam o ritmo
da cidade. O eléctrico 28 a circundar a linda plataforma de calçada portuguesa.
A estátua de Luiz de Camões com pombas a revezarem poleiro na sua cabeça para
espreitarem quem vem do Chiado. Os alunos de Erasmus a conviverem à volta do
pedestal. A passadeira mais insubordinada de Lisboa em que os carros e os peões
têm um acordo secreto para ignorar o semáforo. A conduta de ar que faz os
vestidos das meninas esvoaçarem e os cabelos perderem a compostura. Os prédios
com as fachadas limpinhas e gente lá dentro. Os encontros e as partidas. Cada
metro quadrado, um postal. Cada transeunte, um poema.
A Praça de Luiz Vaz de Camões foi
inaugurada como tal em 9 de Outubro de 1867. A estátua e o pedestal do poeta têm
7 metros e meio, são da autoria de Victor Bastos e foram custeadas por
subscrição pública. Nesse dia, toda a Lisboa foi ali dar. Até os trabalhadores
das fábricas da capital tiveram folga para ir ver El-Rei D. Luís descerrar o pano
que cobria a grande figura de bronze.
Desde então o poeta da nação tem
visto lá de cima a cidade a mudar. Mudam as modas e os costumes. Mudam os
transportes, os sons, o comércio e os cheiros. Chegam os turistas e partem os
habitantes. Mas Lisboa, que da lei da morte já se libertou há muito tempo, continua
circulando num vai e vem de gente que, mais tarde ou mais cedo, há-de ir ter à
hora marcada ao Camões.
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