Há em Lisboa uma igreja onde os
deuses nacionais descansam as ossadas até ao fim dos tempos. O Panteão Nacional
é a coisa mais parecida que temos com o Olimpo. Por lá habitam as almas de duas
mulheres divinas, Amália e Sophia, e de uns quantos homens celestes, de Garrett
a Aquilino, de Humberto Delgado a alguns Presidentes da República, e, um dia
destes, o Eusébio.
Por ordem da Infanta D. Maria se
lançou a primeira pedra da igreja em honra de Santa Engrácia de Saragoça.
Corria o ano de 1568. Pensava a infanta que a obra seria rápida, coisa para uns
cem anos. Porém, uma história de amor meteu-se no caminho e a construção
atrasou. As obras de Santa Engrácia duraram 398 anos.
Em 1631 Simão Pires Solis
apaixonou-se perdidamente por uma noviça do Convento de Santa Clara, que ficava
mesmo ao lado das obras da dita igreja. Todos os dias, mal a noite caía, lá ia
ele encontrar-se com a sua amada. Tal era o enamoramento, que resolveram fugir.
Mas o destino é malicioso e na noite combinada para a fuga, à mesma hora em
que Simão se dirigia ao convento para ir buscar a sua prometida alguém entrava
na Igreja de Santa Engrácia, quase construída, e roubava o sacrário com as
hóstias. O ladrão sumiu-se e Simão apareceu. Logo ali foi rodeado pelo povo,
convencido de que era ele o larápio. E nem o facto do pobre jovem não ter os
objectos roubados com ele persuadiu os seus acusadores. Foi preso e condenado
às fogueiras da Santa Inquisição.
Quando o levaram para cumprir a
pena, passou mais uma última vez em frente ao convento, onde a noviça chorava a
perda do seu amor. Olhou para a Igreja de Santa Engrácia e gritou: “Morro
inocente. É tão certo eu estar inocente como é certo aquelas obras nunca se
acabarem.”
Passados uns tempos, quase com a
inauguração marcada, a cúpula da igreja ruiu. As obras recomeçaram. Depois veio
o terramoto e a igreja tombou. As obras recomeçaram. E foram demorando. Serviu,
entretanto, de armazém de armamento do Arsenal do Exército e de fábrica de sapatos
até ao século XX. As obras foram concluídas por ordem expressa do Governo em
1966, sendo-lhe atribuído o estatuto de Panteão Nacional.
Verdade ou lenda, é certo que a
igreja demorou muito mais tempo do que o esperado a ser erguida. Talvez a
história não tenha chegado assim tão bem contada aos nossos tempos. Talvez
Simão tenha amaldiçoado todas as obras do país. É que obras de Santa Engrácia
há muitas.
Sugestão de correção : "à mesma hora" e não "há mesma hora"
ResponderEliminarSuper-sugestão. É no que dá rever o texto à pressa. Muito grata.
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