domingo, 22 de março de 2015

Era uma vez.









Era uma vez um reino situado à beira de um rio. Os habitantes do reino eram serpentes e a sua rainha era um ser de extrema beleza chamado Ofiusa.

Ofiusa era meia serpente e meia mulher. Bela e sedutora, com voz de menina indefesa, mas má como as cobras. Quem se atrevesse a pôr o pé no seu território, ficaria para sempre seu prisioneiro. Por essa razão, os marinheiros mantinham-se sempre ao largo, traçando as suas rotas cuidadosamente por águas longe do reino das serpentes.

Calhou que Ulisses, nas suas aquáticas demandas, fosse aportar a tal lugar. E logo Ofiusa por ele se apaixonou e resgatou-o para seu amante. Prometeu-lhe o lugar de consorte. Desposá-lo-ia e enchê-lo-ia de glória e poder. Levou-o para o seu palácio no lugar mais alto do reino e banqueteou-o de ouro e pedrarias.

 Mas Ulisses tinha a sua Penélope à espera em Ítaca e não a trocaria por todas as riquezas do mundo. Resolveu fingir. Esperaria que a sua tripulação reestabelecesse as forças, encheria o porão do navio de mantimentos e zarpariam para nunca mais voltar.

Ofiusa viveu dias de felicidade. Tinha um homem bravo e garboso ao seu lado e um reino temido e temeroso. Que mais uma rainha pode desejar? Ulisses, prudente, tratou de a bem cuidar. Elogiava a sua formosura e mimava-a com desvelo.

Mas a sorte não se força e o dia chegou em que Ulisses conseguiu escapar. Quando Ofiusa acordou com os primeiros raios de sol, viu o lugar ao seu lado na cama vazio e teve um mau pressentimento. Correu para a janela e assistiu ao barco de Ulisses a desaparecer no horizonte.

Numa fúria cega Ofiusa estendeu os seus braços até ao rio invocando todas as suas forças. Cega de raiva, destruiu tudo à sua passagem. Serpenteou as terras, criando sulcos tão profundos que deles nasceram sete colinas. Mas ficou com os braços a boiarem sobre as águas, vendo o seu amado cada vez mais distante até desaparecer.

Depois disto, sofreu para o resto dos seus dias. Só e louca a vaguear pelos quartos do palácio. De tanta solidão magicou uma história de amor. Na sua cabeça, Ulisses continuava a seu lado. Juntos criavam um reino ainda mais poderoso e famoso. Davam-lhe o nome de Ulisseia.

Se esta história é certa não se sabe. Sabe-se que o nome do reino se estendeu pelos séculos. Sofreu as erosões das línguas dos povos que o invadiram.

Olissipo.
 Olissipona.
 Lisboa.

E se Ofiusa não viveu feliz para sempre com o seu Ulisses, deveu-se talvez ao facto de nesta narrativa ela ser a rainha má. Mas até as rainhas más fazem coisas boas. Deu-nos as colinas e este nome tão bonito e bom de dizer: Lisboa.

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