Ai este meu fado de fugir ao fado
desde que comecei este blog.
Ai esta saudade do que ainda não
escrevi quando olho para a folha em branco.
Para escrever sobre Lisboa é
imperativo escrever sobre o fado. O fado é o sangue que corre nas veias da
cidade. É o sentimento mais profundo e empedernido na alma de todo o alfacinha.
É o coração desta cidade que transborda e se transforma em portugalidade. Ai
que medo de escrever sobre ele.
Ai Madragoa.
Ai Mouraria.
Ai este meu fado de não saber por
onde começar. Se pela Severa ou pela Amália. Se pelo Carlos do Carmo, se pelo
Marceneiro. Se pela Moraria. Se pela Madragoa. E onde meter Alfama? Pela Rua da
Palma ou pela Rua do Capelão? Faca na liga, ponta e mola, prostitutas,
marialvas, faias, marinheiros, taberneiros, cavaleiros e toureiros. E a saudade?
Ai a saudade.
Onde é que eu meto a saudade?
Os destinos trágicos e a
amargura. A felicidade evaporada e a alma afundada em aguardente. Os cigarros,
a boémia, as vielas escuras, a vontade de Deus e a ansiedade. Um fadinho ou um
faduncho. Nobre ou vadio. Começo pela Hermínia. Ou então pelos mais novos, pela
Aldina, pela Ana Moura, pelo Moutinho, pela Gisela e pelo Camané.
Ai o Camané.
Como explicar a voz do Camané?
Vou pela sina. Pela cigana ou
pela varina. Pela trança preta da menina. Pela viola ou pela guitarra. Pelo
povo a lavar no rio. Pela voz que dói a cantar, pela janela das tabuinhas, pela
luz de Lisboa, pelo barco negro. Pelo David Mourão Ferreira, pelo Ary, pela
Natália, pelo Oulman ou pelo Carlos Paredes. E confesso às paredes que não me
lembro de todos? E o destino?
Ai o destino.
O que é que eu faço ao destino?
Deixo-o vir. Deixo-o ditar-me as
letras que hei-de escrever sobre o fado. Porque é fatalidade certeira que o fado
primeiro sente-se e só depois de diz. E só depois se canta. E se quis o destino
que eu não tivesse voz para ser fadista nem unhas para tocar guitarra, nesta
coisa de escrever sobre o supremo fado, não me há-de trair. E eu hei-de
explicar o fado tal como eu o oiço. Mas não é hoje. Hoje fico em silêncio e vou
ali ouvir um fado.
Tudo isto é fado! :))))
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