Desde pequena que me lembro de
ouvir o meu pai dizer: “O que gosto mais de Lisboa é de ver a placa que tem
escrito: A1 Norte”.
Quando vim para cá morar, passei a
adorar aquela placa também. Era para mim uma libertação. Aí ia eu rumo às
minhas pessoas, aos meus sítios, à minha terra. No entanto, e como seria de
esperar, em breve me encantei por esta cidade e fiquei com a alma dividida. Ou
melhor, fiquei exactamente como aquela canção do Jorge Palma que diz que “tenho
duas almas em guerra e sei que nenhuma vai ganhar”.
É verdade que, para quem cá não
mora e vem cá só de vez em quando para ver a bola, ou a filha, Lisboa é uma
cidade tão confusa que pode até ser violenta. A grande quantidade de semáforos,
as filas de trânsito, as passadeiras cheias de gente, as avenidas muito largas
e as ruas demasiado estreitas. As pessoas que passam por nós sem nos ver. Os
rostos cansados. As corridas para o autocarro. Os inúmeros autocarros e as
linhas do Metro. Os carteiristas, os malabaristas dos semáforos, os taxistas
refilões, as buzinadelas e os encontrões. A poluição, as ruas sujas, os sem-abrigo,
os pedintes e os loucos que vão pelas ruas a falar sozinhos.
Lisboa aos olhos de quem cá não
mora anda sempre depressa demais, sempre atrasada sem chegar a nenhum lado.
Sempre tarde para descansar. E quando descansa, descansa à pressa, porque há
muita coisa para fazer e a vida corre corre e eu tenho que a apanhar.
Mas quem cá mora.
Quem cá mora anda neste ritmo
rápido e não o sente. Move-se naturalmente a alta velocidade. Sente-se tanto
peixe na água como quem mora em águas mais calmas. Faz parte desta paisagem que
passa depressa e acha normal. Acha que os semáforos são muito lentos, que os
autocarros são poucos e dá à buzina porque quer passar. Conversa com os
taxistas, topa os carteiristas, não olha para as pessoas na rua porque vai na
sua vida e, por vezes, dá por si a falar sozinho.
Mas às vezes.
Mas às vezes precisamos de travar
a cidade que circula dentro de nós e rumar ao nosso outro sitio. E é por isso
que a placa que tem escrito “A1 Norte” continua a ser uma das minhas coisas
preferidas de Lisboa. Mesmo que quando passe por ela eu lhe segrede baixinho:
Até já.
Sou alfacinha de gema, e para mim, é claro, isso não é a melhor coisa de Lisboa! :b
ResponderEliminarMas este texto está tão bem conseguido!! É tudo tão verdade!! Nós, em Lisboa, vivemos mesmo sempre a correr. E só reparamos nisso, e falo por mim, quando marcamos umas férias e vamos para outro ponto do país! Como o Porto, ou Coimbra! E aí notamos que realmente as coisas em Lisboa passam a correr. Coisa que nas outras cidades em que estive não sucede!!
Mais uma vez, parabéns pelo texto! E um bem-haja!
Grata Fábio Alfacinha ;)
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ResponderEliminarAmo a minha cidade, Lisboa, sem querer saber muito bem porquê - quando se gosta muito é mesmo assim... gosta-se e pronto! - e mesmo com tudo o que descreveste, que eu concordo, eu continuo a gostar de Lisboa como não consigo com outra cidade.
ResponderEliminarNo meu coração, felizmente, existe espaço para muitos outros locais, mas esta cidade caótica (e com coisa, também, lindíssimas) ocupa um lugar de destaque.
Há sempre lugar em nós para mais uma cidade. Mesmo que Lisboa nos encha as medidas. Grata.
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